Tropa de Elite – o filme

 

Mauricio Dias 

Este texto está cheio de parênteses, pois eu cito muitos links que serviram de fontes para a elaboração do mesmo. Evidentemente, os meus doze leitores podem passar batidos por estas citações a links, eles em sua maioria não são fundamentais à compreensão do texto, estão aí só como prova documental – os links realmente importantes, estão destacados.

Em agosto, algumas pessoas vieram comentar comigo o filme “Tropa de Elite”, pois a cópia pirata estava circulando pela cidade.

O diretor do filme, José Padilha, revoltado com a pirataria, publicou um artigo no jornal O Globo – ‘Nas ruas, gato por lebre’, 28/08/2007 -, criticando piratas, autoridades e consumidores e acusando a imprensa e policias de violarem, declaradamente, direitos autorais e patrimoniais ao comentarem publicamente trechos do filme.

O Arnaldo Branco, do site mauhumor escreveu:

“…o cara me faz um filme que denuncia entre outras coisas a corrupção na polícia (na PM, o Bope é sagrado) e fica revoltado com a inoperância da corporação para coibir a circulação de cópias ilegais. Devia estar contando com a ajuda do Homem-Aranha.”

Artur Xexéo, no segundo caderno d’O Globo escreveu um texto que partia de uma idéia engraçada, a de que queria falar do filme, mas pelo cd ser pirata, não ficava bem admitir publicamente tê-lo visto. (em http://oglobo.globo.com/opiniao/mat/2007/08/29/297492776.asp)

Após a prisão dos envolvidos na produção da cópia pirata, Padilha mudou um pouco o tom do discurso, declarando-se “muito feliz com o sucesso da Delegacia de Repressão aos Crimes contra a Propriedade Imaterial” (em http://www.celebrities.com.br/noticias/noticias.asp?ID=5416)

Bom… Eu ainda não vi, sério. Mas um conhecido meu narrou-me algumas cenas: execução com tiro no rosto, humilhação dos recrutas, uma série de brutalidades.

O livro em que o filme se baseia, “Elite da Tropa”, foi publicado em 2006 por André Batista e Rodrigo Pimentel (ex-integrantes do Bope), em parceria com o sociólogo e ex-subsecretário de Segurança Pública do Rio Luiz Eduardo Soares – o qual tem ligações com a ONG Viva Rio. Sobre o Viva Rio, vale a pena dar uma conferida em http://www.diegocasagrande.com.br/index.php?do=Wm14aGRtOXlKVE5FYldGdVkyaGxkR1Z6SlRJMmFXUWxNMFF4TkRRM01qUkxRUT09WnhQMko http://desarmamento.tripod.com/articles/Submissao.html

Sobre o livro, achei uma matéria antiga (extraída de http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u120946.shtml ): “Quando soube da existência do livro, (…) o relações-públicas da Polícia Militar, tenente-coronel Aristeu Leonardo havia dito que os autores não representavam a corporação e que os dados não podiam ser considerados fatos, apenas ficção. A PM só se manifestará a respeito da obra quando ela for lançada.”

Aristeu Leonardo? O A. L. Tavares, que também é juiz de futebol? http://www.cartaovermelho.esp.br/modules.php?op=modload&name=Sections&file=index&req=viewarticle&artid=31&page=1

É o próprio. 

É claro que o impacto do filme no público será muito maior que o do livro, quantas pessoas lêem um livro sobre este assunto? Cinqüenta mil? – não faço a menor idéia, dei uma procurada sem resultados e enviei email à Editora Objetiva – se eles responderem, eu acrescento.

Um filme desses, só nos cinemas do Brasil deve ser visto por mais de dois milhões de pessoas; fora quando saísse oficialmente em dvd – e aqui, entra é claro, a situação de exceção que foi essa pirataria desenfreada, sabe-se lá quantas pessoas que pagariam pra ver o filme já viram a versão que circula. 

Provavelmente, organizações como o Viva Rio, Anistia Internacional, Instituto Sou da Paz, Ongs diversas, talvez até a OAB já estejam com textos de protesto contra o Bope prontos, mas ainda não lançaram pela mesma razão que Xexéo não comentou o filme a fundo: não fica bem admitir já ter visto a cópia pirata.

O quanto do livro e do filme será factível?

Quem sabe como foi mostrada nas telas a Guerra do Vietnam, sabe o quanto um conflito que tem implicações políticas pode ser manipulado com total desprezo pela verdade. Quem vê ‘Platoon’ (Oliver Stone) e ‘Nascido para Matar’ (Stanley Kubrick) sai com uma visão, quem vê ‘Fomos Heróis’ (Randall Wallace) e ‘Os Gritos do Silêncio’ (Roland Joffé – na verdade este se passa no Camboja, mas o massacre de um quarto da população deste país é conseqüência direta da Guerra do Vietnam) sai com outra, diametralmente oposta.

O ponto é: cinema nunca é isento. Seja mostrando o Vietnam, seja na Cidade de Deus, onde for, o que se vê é sempre fruto de uma manipulação consciente. 

Mesmo fotos nem sempre dizem a verdade: a foto que ilustra este artigo contém uma cena da Guerra do Vietnam célebre e chocante. Também foi captada em filme. A execução sumária de um homem desarmado é INDEFENSÁVEL.

Porém, 1) era uma guerra, uma situação de exceção – não estou justificando nada, se alguém alegar em contrário sentir-me-ei livre para responder com palavrões. E 2) na última semana deste agosto, vendo um documentário do History Channel (“canal americano, imperialista!” – urrarão alguns) sobre o Vietnam, mencionou-se o massacre de civis na Cidade Norte-Vietnamita de Hue, promovido por guerrilheiros vietcongs (comunistas), que eliminaram ali milhares de pessoas que não quiseram aderir à ‘causa’. Quem quiser saber mais vá ao Google e digite “hue massacre”.

O que é narrado neste documentário é que o sujeito que é executado diante das câmeras era um vietcong que fora preso após massacrar uma família inteira. O fotógrafo que tirou a foto, depois de conhecer melhor o oficial que disparou o tiro pediu desculpas pela imagem que a foto passava dele. É claro que isto não justifica uma execução sem nenhum tipo de tribunal, mas a idéia passada pela foto é “assassinato covarde de uma vítima indefesa”; e, bem, ao que parece a realidade não era exatamente essa.

Mas estes fatos dos últimos parágrafos nunca foram divulgados, ao passo que a foto foi veiculada à exaustão.

Voltando ao cinema brasileiro, sua tradição de filmes policiais bem feitos desde ‘Amei um Bicheiro’ e ‘Assalto ao Trem Pagador’, até chegar ao filme de José Padilha, vale MUITO a pena ler o (longo, mais de 15 páginas) texto de Olavo de Carvalho sobre o tratamento dado à criminalidade pela mídia e ‘cultura’ nacionais, o qual se encontra em http://www.olavodecarvalho.org/livros/bandlet.htm

Todos têm o direito de discordar do texto. Mas é melhor discordar depois de o ler – discordar previamente, apenas pelo nome do autor, é burrice.

Sobre o filme em si, além do Xexéo, sei de primeira mão de um segurança de banco e um porteiro que acharam ótimo. E quem ler este texto do Olavo vai entender porque as classes sociais c e d vão gostar do filme e os intelectuais vão criticá-lo, justamente pela mesma razão – por mostrar criminosos morrendo: “Se o apoio a medidas de força contra o crime vem sempre das camadas mais baixas, não é só porque são elas as primeiras vítimas dos criminosos, mas porque elas estão fora do raio de influência da cultura letrada. Da classe média para cima, a aquisição de cultura superior é identificada com a adesão aos preconceitos consagrados da intelligentzia nacional, entre os quais o ódio à polícia e a simpatia pelo banditismo.” (OLAVO DE CARVALHO, in Bandidos & Letrados)

copyright “comoeueratrouxa”  🙂

3 Responses to Tropa de Elite – o filme

  1. Marlosm disse:

    Eu vi o filme. Está no YouTube, em 12 capítulos de cerca de 10 minutos cada. Vi o DVD pirata na casa de um amigo. Não sei se pega bem ou não admitir isso. Quando for lançado, quero ver no cinema.
    O fato é que o filme vai dar muito o que falar, à parte a história da pirataria. Por vários motivos:
    1. Não tenta humanizar a favela, mostrando Acerolas e Laranjinhas. É barra pesada mesmo. Mostra uma guerra. Não há mocinhos e bandidos, só lados opostos de uma guerra. E o trabalhador que mora na favela continua lá, oprimido pelo tráfico ou pela polícia.
    2. Mostra violência e brutalidade policial e a justifica. Você pode concordar ou discordar, mas não pode dizer que é gratuita.
    3. Mostra que boa intenção não basta. Você pode ler “Cidade Partida”, entrar numa ONG e tentar ajudar os menos favorecidos. Isso é louvável e rende frutos para a comunidade. Mas não significa que, se a chapa esquentar e o interesse do tráfico for ameaçado, sua cabeça será poupada.
    4. Mostra que você pode ler Foucault, alardear que a polícia é violenta e só pune os pobres e os marginalizados. É louvável, mas só serve para você se sentir socialmente responsável. Não interfere em nada para quem sofre ou comente essa violência.
    5. Levanta novamente uma questão que ainda incomoda: quem consome drogas ajuda a financiar o tráfico e a violência?

  2. Giovanni Finetti disse:

    Bom texto. É bem por aí mesmo; bandidos idolatrados e policiais massacrados. A classe média lota os cinemas e se emociona com histórias de meninos pobres que não tiveram alternativa senão cortar cabeças, com um machado, de cidadãos honestos. Autoridades do Estado assistindo cópias piratas é o símbolo do Rio de Janeiro. Aliás, quem patrocionou o filme? BR, Petrobrás, BNDES de NOVO???? Ou a gente vai ver uma graninha do Itaú por aí? eheheheh

  3. Cara, não sei como o link para este artigo veio parar em meu e-mail. Li e achei bastante interessante. Porém, quero comentar apenas um ponto em especial: o público que frequenta o cinema. No Brasil, 2 milhões de público pagante é um super sucesso! Esse filme só terá esse público se for realmente um estouro. Vide “entre 1995 e 2003, 58% do total dos filmes brasileiros que estrearam nos cinemas ficaram abaixo de 50 mil espectadores. Se nos dois anos seguintes esse percentual cresceu para 62% (2004) e 64% (2005), no primeiro semestre de 2006 ele atingiu um número impressionante: 83%. Isso significa dizer que, dos 5,8 milhões de espectadores acumulados pelo cinema brasileiro em 2006, 5,2 milhões estiveram concentrados em apenas 3 filmes (Se Eu Fosse Você, Didi – O Caçados de Tesouros e Xuxinha e Guto Contra os Monstros do Espaço).”, que lê-se em: http://www.revistacinetica.com.br/brasilpraquem2.htm . Parabéns, um abraço e até+!

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